Os irmãos e irmãs compartilham, biologicamente, pelo menos um pai ou uma mãe. Há casos em que compartilham os dois. Em outras circunstâncias, escolhemos irmãos e irmãs entre nossos colegas e amigos. Mas há situações em que nossos pais – ou um deles – escolhem irmãos para nós. Vou contar a história de como ganhei a irmã do meu coração...
Numa dada oportunidade, entra para o patrimônio da família um conjunto de pratos de um material sintético e transparente. As tigelas, circulares, lindamente côncavas, são três tamanhos diferentes: a maior, talvez, medindo uns 40 centímetros de diâmetro, a do meio uns 30 e a menor, perto de uns 25. Como uma cabe dentro da outra, ocupam pouco espaço quando guardadas. Por sua singularidade e beleza, eram disputadas por quase todas as mulheres da família. Minha sobrinha mais velha e eu sempre tivemos olhos cobiçosos para elas.
Falo das tigelas antes de falar da irmã por motivos cronológicos: algumas coisas acontecem antes, e outras depois.
Morava no mesmo andar um jovem casal e, certo dia, no elevador, imaginando ser uma boa ocasião, minha mamãe pergunta qual a cor do quarto do bebê que não demorava muito iria nascer. O futuro papai, serenamente, responde:
- Preto.
Não preciso nem dizer que o assunto acabou por ali mesmo. Recolhem-se, a um canto, minha mãe e sua curiosidade interessada em providenciar algum mimo. O elevador alcança o andar, abre-se e todos desembarcam, eram quase vizinhos de porta.
Pouco depois, num chimarrão, a grávida explica que o marido era muito debochado e que aquilo era uma brincadeira. O tempo passa, a amizade fortalece, convites recíprocos de visitas, aniversários e eis que as tigelas são apresentadas a querida amiga... amor à primeira vista: agora somos três a disputar o regalo.
Minha sobrinha considerava que devesse herdar as tigelas, pois que é a neta mais velha e saberia cuidar delas direitinho. A doce vizinha não se arriscava em muitos comentários, mas insistia em saber onde foram compradas, tamanho seu interesse pela beleza e praticidade de tais objetos. Bem, eu deveria, ao menos, ser consultada sobre o destino de tais pratos quando se fizesse a oportunidade de transmitir a herança. Mas, a cada festa, todas as mulheres juntas, voltava-se ao mesmo assunto. Razões e argumentos para cá, desejos e chantagens para lá...
Um dia, num junho há alguns anos passados, mamãe pediu que eu providenciasse um papel para embalar um presente muito especial. Solícita filha, cuidei de trazer um bem colorido, bem ao seu gosto.
E naquele aniversário, ganhei uma irmã. Aquelas tigelas eram o típico presente que só uma mãe de verdade daria para uma filha. E ela as deu para Inês. Resolveu assim o que poderia ser um impasse ou uma fonte de melindre familiar de uma forma generosa, inclusiva e feliz. Desde então, Inês é minha mais amada irmã do coração.
Um comentário:
Que linda história, bem contada, tanto que deixa a gente querendo "ver" as tais tigelas...
sda
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